Que saudade do Cara...
Depois de três semanas se
tornarem um tabu diferenciado, enovelado entre outras milhões de farpas e coerências
fundamentadas em absolutamente nada, digo, nada mais, resolvi sentar e
escrever, escrever alguns sentimentos guardados em mim que não lembrara há
algum tempo, acho que por estar sufocado pelo sentimento medíocre que eu tinha
pelo Husky Siberiano. Sem espaço para viver, sofrer a perda do Homem que mais
me fez feliz até hoje, sem cobranças, sem pressões e com uma sutileza
extremamente singela...
Correndo hoje em pleno temporal
em meio ao semi escuro de um lugar que para mim tornou-se extremamente familiar,
lembrei-me do Cara, meu melhor e maior amigo, o Cara que mais me fez feliz nestes
últimos 12 anos de vida. Aquele que me acompanhara em minha jornada de vida “árdua”,
nos momentos de decepção, de felicidade, de angustias, de vitórias, sempre ao
meu lado, mesmo eu não percebendo, ele estava lá, trazendo aquele
incomensurável sorriso gostoso que iluminava todo meu caminho, me fazendo
sentir alguém realmente amado.
Lembro de certa vez em que estávamos
deitados em sua cama, em uma noite de verão com grandes estrelas a mostra no céu,
após uma noite de vinhos refinados que ele me havia proporcionado, depois de assaltar
a adega de seu requintado Pai. Permanecemos ali deitados escutando Oasis, ambos
de roupas de baixo, envoltos por um lençol branco e suave. Deitei em seu braço
que estava aberto, aguardando qualquer atitude minha, como uma ratoeira
aguardando apenas um movimento favorável para abocanhar aquele rato que por ali
passara. Olhei para ele, apenas apaixonado pelo meu melhor amigo, mas apaixonado
não no sentido franco da palavra popularmente vulgarizado, mas apaixonado,
encantado por ter um amigo tão franco em toda minha vida, um Cara que me queria
de qualquer forma, sem pudor qualquer. Ele olhava para mim com uma face tão
absurdamente estarrecida de tanto sentimento bom que havia dentro dele,
referindo-se a mim, parecia que queria me abraçar, me dar todo carinho do mundo
para me ver feliz.
- O que você faria se eu
morresse, Thinker?
- Porque está falando isto? Somos
tão novos para morrer! Não quero pensar nisto, não vai acontecer! - Pensei um
pouco, percebi algum interesse no ar e retornei a pergunta. - O que você faria se
eu morresse?
- Eu iria junto com você. Não
suportaria ver a pessoa que mais amo nesta vida partir sem mim, seria egoísmo demais,
não só por sua parte, mas por Deus também, em lhe querer longe de mim e mais próximo dele.
Assustado com o que acabara de
ouvir, duas lágrimas escorreram de meus olhos. Não sabia o que falar, mas sabia
que nunca haviam falado isto comigo da forma que havia ouvido, com tanta
sinceridade e sentimento embutido em uma só voz.
Às vezes me pego pensando no que
seria melhor para mim hoje, ter acatado todo seu amor e vivido com ele o resto
de minha vida de uma forma feliz, mas sem ter certeza de meus sentimentos, ou
fiz a escolha certa, perder o Cara que hoje percebo ter mais amado como Homem,
como um amigo, como um grande amor que não deixei aflorar com medo de estragar
tudo, toda nossa amizade? Será que teríamos vivido felizes? Será que teríamos ido
morar juntos? Vivido amistosamente, sem ofender um ao outro com palavras
deploráveis como vivi há pouco?
Sinto hoje a dor da perda do meu
amigo, pois, depois da grande enchente, me resta um grande rombo, maior que o
Challenge Deep, quem sabe 2 vezes maior que ele... Não consigo esquecer tudo
que passamos, nossos 12 amos de amizade, de amor, de felicidade, de choros
consolados, de paz, de cumplicidade, de descobertas, mesmo as mal feitas, mas
descobertas progressiva que nos enlaçava cada segundo mais, fazendo com que nos
apertassem a ponto de não nos desgrudarmos mais, quem sabe se tornando apenas
um...
E neste dia, após perceber meu
retorno sobre o que havia me falado, ele afagou meu cabelo e disse o quanto me
amava pelo que eu era, por tudo que havia feito com e por ele, por tê-lo tirado
daquele mundo vicioso que todos gostavam de viver, a alienação soberana. Me
acertou um beijo nos lábios sem eu ter tempo de qualquer reação. Apenas senti
seus lábios contra o meu, em busca de realização, união entre duas pessoas a
ponto de nunca mais se separarem. Compreendendo o sentido daquilo tudo, me
senti feliz, feliz por perceber que ele sentia a necessidade de sermos apenas
um, como eu sentia. Vendo-o sorrir pela minha reação de admiração, deitou
dorsalmente e me convidou a deitar em seu peito, batendo levemente com a mão em
seu peitoral. Apoiei minha cabeça ali e senti seu coração bater aceleradamente,
sua respiração acelerar, seu corpo umedecer rapidamente, esboçando um leve suor
nada desagradável. Era ele, o Fernando, meu amigo, deitado comigo por toda
eternidade em meus pensamentos, mesmo sentindo nunca mais vê-lo, mas ainda
esperando a oportunidade ingênua de encontrá-lo um dia na rua e rirmos de tudo
isto, ou simplesmente acordar com ele ao meu lado no dia seguinte e rirmos de
todo este pesadelo.