domingo, 4 de julho de 2010

A Primeira Ab-Reação


Ainda no domingo que havia terminado com o Fotógrafo, após escrever e postar o texto anterior, resolvi sair de casa, estava desapontado, precisava ver pessoas, beber um pouco e pensar em alguma coisa que não fosse essa situação. Fui com a Lesada para um dos bares que mais gosto de freqüentar em Belo Horizonte, o Liberdade, e após, resolvemos estender nossa conversa e processo social em um “pseudo bar” dançante, onde tinha o costume de ir com a Afrodite.

Mesmo envolto por pessoas, eu ainda estava sentindo alguma coisa muito estranha dentro de mim, um aperto no peito, um sentimento de perda, grande ou pequena, era alguma perda. Engraçado, toda vez que termino, gostando ou não do par, normalmente eu tenho esse sentimento, como se fosse um livro que após se conhecer grande parte do conteúdo (intimidade), o mesmo é fechado, colocado na prateleira de uma biblioteca portadora de milhares de exemplares e deixado ali, sujeito à exposição para outro alguém. Tudo bem que o livro acrescenta muita coisa na vida do leitor - Querendo ou não, acrescenta sim!-, porém, sabe-se que seu conteúdo, talvez nunca mais seja violado, e, definitivamente isto é triste! - Não o livro, digo em se tratando de pessoas. Nunca fui um cara que soube lidar muito bem com as “perdas”, imaginem: você se entrega na íntegra a uma pessoa, expõe sua intimidade mais profunda e quando o relacionamento finda, cada um vai para o seu caminho e simplesmente se esquecem, ou fingem esquecer o que foi vivido,muitos momentos que até então foram julgados como especiais. Aí, num quarteirão posterior do caminho de ambos, surgem novos parceiros, em que a intimidade novamente é entregue, levando a uma rotina amedrontadora.

Os rapazes que tentavam uma conversa semi-amistosa comigo, saiam pouco constrangido, eu os tratava com suprema hostilidade, a ponto de ficarem sem palavras perante as minhas citadas.

Por volta das oito da noite, no auge do local, vi um homem com o rosto conhecido em meio àquela multidão. Olhei uma vez e não lembrava bem quem era, mas quando ele me percebeu o olhando, sorriu e olhou diretamente nos meus olhos. Sim, soube naquele momento quem era ele, a Piranha do Banheiro. Instantaneamente disfarcei o olhar surpreso com um sorriso discretamente torto para a Lesada e informei-a sobre tal presença.

Ele estava muito bonito, havia se transformado de acordo com a gravidade terrestre, vestira uma blusa azul escura, calça jeans e tênis, estava mais velho, seus cabelos estavam castanhos e um pouco grisalhos, aumentara bastante sua massa muscular de forma geral e seu sorriso permanência o mesmo, bonito e tentador.

Conversamos, inicialmente, assuntos aleatórios que não se sustentavam por muito tempo, já que o nosso interesse era ouvir outras coisas. Provavelmente no início ele se se intimidou em tocar no assunto pendente que havia comigo pela presença da Lesada, pois, quando ela saiu de perto ele logo começou a falar. Disse que eu era a única pessoa que ele tinha vergonha de olhar nos olhos, que na época em que havia me magoado era porque ele queria sentir-se sozinho, já que acabara um relacionamento de forma conturbada, mas que em momento algum jogou sujo comigo, sendo sincero - Não entendi bem esta parte, pois, se ele não tinha coragem de olhar em meus olhos era por ter convicção de que em algum momento teria feito algo não muito memorável comigo. Elogiou-me muito, disse que eu estava maduro, interessante, bonito, que meu corpo havia se desenvolvido... - Ignorei esta parte. Enfim, falou muita coisa que me deixou estático, principalmente a parte que queria ter um relacionamento comigo, que naquele momento estava preparado para tal, já que ficara quatro anos solteiro, “vivendo pelos cantos”.

Embora ele fosse um homem estável, bonito, independente e sua família pouco se importasse com sua peculiar vida idiossincrática sexualmente prometida, não “caí” muito na dele, acho que falara tudo isso por perceber que estava a mercê da velhice, que não se sentia mais o cara de antes, procurando, então, por estabilidade, ou não, vai saber... Além do mais, ele vivia no mundo de uma forma não muito amistosa, percebi que ele era usuário de maconha e através de seus tragos, entrava em um mundo que não deveria visitar. Assim, resolvi não seguir a conduta "normal" da humanidade que em vez de tapar os buracos da vida, os cultivava para viver dentro.

Por fim, senti um peso a menos em meus pensamentos, uma ab-reação fantasticamente executada em meu inconsciente, qualquer trauma causado por ele em minha vida havia se dissipado naquele momento, transformado em ar, que pelas minhas orelhas escaparam fervorosamente. Percebi que após nossa conversa, não sentia mais nada ao pensar nele, revolta, raiva, mágoa, seja lá o que for, apenas vinha à tona um sentimento de pena, um homem muito bonito, simpático, relativamente inteligente que perdera oportunidades e parte de sua existência em uma vida mundana, sem limites e de juventude que não deveria existir, já que portara seus quarenta anos de idade.

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