sábado, 24 de janeiro de 2009

Ying e Yang


Essa semana andei pensando no nada. Um simples pensamento negro assolou minha cabeça, negro não no sentido metafórico da palavra. Não tive tempo o suficiente para lembrar do que não tive e/ou do que ainda não sei se terei, simplesmente vivi meus dias com raciocínio lógico e concentrado no que acontecera no momento, ou seja, meus pacientes. Eis que chega o fim de semana (sexta feita a noite) e tudo que havia “não-lembrado” apareceu. Mas acho que estou ignorando bem, ando trocando-os por estudo e muita música (embora elas expressem exatamente o que eu penso no momento...). Mas, não houve escapatória para um pensamento que foi desencadeado por uma música que escutei: o meu amigo Gió, não teve como não lembrar dele hoje, de quão inusitado foi nosso primeiro encontro, de como amigos éramos e como a distância nos separou.

Nos conhecemos em um lugar que era bastante comum para a população gay de Belo Horizonte e não demos importância um ao outro. Mas como o destino queria que fossemos amigos, nos encontramos novamente, quando eu namorava o Marcelino troca-Tapa, em uma festa que ele promovera em sua mansão em Nova Lima. Daí para frente não nos esquecemos, pelo menos eu não o esqueci, sempre nos comunicávamos por telefone ou nos víamos uma vez por semana na Praça da Savassi, mas nunca deixávamos de nos falar. Passamos verdadeiros apertos juntos, mas ele quem gostava de passar por isso, e eu bobo acabava junto. Uma vez ele cismou de que iria furtar um determinado estabelecimento e levou junto o Marcelino Troca-Tapa e o Dundinha (risos... acho que ambos tinham cleptomania, pois nunca precisaram disso, ambos tinham muita grana, furtavam pela situação, por prazer. Mas na época não tinha maturidade e nem estudo para afirmar isso a eles). Eu, vendo que ia dar problema, acabei esperando lá fora com um conhecido meu. Percebendo a demora, entrei a procura dos três e com uma boa desculpa pensei que reverteria essa situação que para mim soava embaraçosamente. De repente olhei para o lado, onde havia uma grande janela de vidro e vi os três patetas olhando para mim, sendo obrigados à exporem suas faces à todos que passavam por ali, ou seja, o troféu do estabelecimento (pois, os pegaram em flagrante) e os ícones da vergonha para os membros da sociedade. O Dundinha que era negro, naquele instante, estava branco igual cera, eles estavam com olhar fixo no ar, assustados e por um momento percebi que seus olhos me seguiam, mas por um motivo superior, evitaram continuar a me seguir -“vergonha”, pensei. Por fim, saí estremecido e aguardei lá fora com medo do pior, mas no fim, a mãe do Marcelino foi até o estabelecimento com seu pai e retiraram os três daquela situação absurda. Mas o relato deles foi o melhor da história: segundo eles o Gió teve que tirar a roupa toda para ser revistado, ai acharam um suco em pó dentro da cueca dele e o revistador perguntou -“O menino! Vai tomar suco com gosto de saquinho?!” Demos boas risadas deste acontecimento, mas nunca mais eles fizeram isso.

E o caso do vômito na minha casa –“Ei! Thinker, Thinker! Traz logo uma sacola porque eu vou vomitar!....”, mas deixa para uma outra oportunidade.

Gió sempre foi um cara bonito, do mundo, nunca pensou em conseqüências, diferente de mim, Mister Thinker, sempre centrado na responsabilidade, um cara sério até demais. Acho que por isso nossa amizade dava certo, o Ying e o outro Yang. Certo tempo ele conheceu um cara e resolveu juntar toda sua bagagem de vida e ir morar com ele, em outro país, para mim, outro mundo. Não concordei com isso, mas ele se foi assim mesmo, meu amigo que mais gostei, o que mais me acompanhou desde que nos conhecemos, simplesmente se foi. Inicialmente foi um choque, mas depois em acostumei, não nos falávamos muito, mas sempre que possível.

Até hoje ele apareceu no Brasil três vezes, a primeira foi com seu outro namorado que trabalhava em uma empresa importante e tinha muito dinheiro, muito mesmo a ponto de gastar com besteira... coisas triviais (enfim, rico). Viajamos para Serra do Cipó, Ouro Preto, Sabará City, ah! Como foi bom!

Da segunda vez eu não dei a atenção que podia, senti muito por isso, mas os momentos que passamos juntos foram os melhores, principalmente quando saímos a noite, depois dormimos na casa do Cavalinho, acordamos e fomos ao clube com minha mãe e alguns amigos. Recordo principalmente do final da tarde (claro!), o crepúsculo em nossos olhos e eu pedindo por dentro fervorosamente para que o dia não acabasse, mas, infelizmente (ou felizmente) não somos os controladores do tempo e aquele dia se acabou sim, mas nunca o esqueci.

A terceira e ultima vez não foi a melhor, acho que não tínhamos o mesmo interesse, ele trouxe outro namorado e acabamos praticamente afastados, melhor, ele afastado de mim. Sempre ligava para ele, mas não me atendia, não estava em casa, sempre, ai, no dia em que estava indo embora, duas semanas depois do paradeiro, ele me ligou pedindo que fosse levá-lo ao aeroporto. Eu, possesso, neguei , preferi passar a noite com meu namorado, na época o Professor, maldito Professor. Arrependo-me amargamente por esta atitude, gostava e ainda gosto muito do Gió, que apesar ser mais meu amigo de férias, incrível! Sempre nos momentos ruins ele aparece, de alguma forma, mas aparece.





*As músicas não são comtemporâneas, nem cantadas, mas o som lembra muito os momentos em que vivi com meu amigo Gió.

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